Hoje, tudo o que temos de fazer é substituir ‘Levtchenko’ por agentes da China ou da Península Coreana.
A maioria dos japoneses permanece chocantemente indiferente às realidades e aos objetivos das operações de inteligência soviéticas contra o Japão. No entanto, as operações da KGB contra o Japão têm sido implacáveis e meticulosas.
29 de outubro de 2018
Esta é uma republicação, com o objetivo de alertar o público, de um capítulo originalmente publicado em 25 de abril de 2018.
O Caso Levtchenko
(A ênfase no texto e na declaração final é minha.)
O Caso Levtchenko refere-se à exposição das atividades de inteligência soviética no Japão conduzidas por Stanislav Levtchenko, major do KGB (Comitê de Segurança do Estado da União Soviética).
Em 14 de julho de 1982, Levtchenko revelou os detalhes de suas operações em uma audiência fechada do Comissão Permanente de Inteligência da Câmara dos Representantes, causando comoção no Japão e no exterior.
Antecedentes – Deserção
Após se formar no Instituto de Estudos Orientais da Universidade Estatal de Moscovo, Levtchenko trabalhou em um instituto de pesquisa pesqueira antes de ingressar na KGB.
Após concluir o curso de japonês e o treinamento relacionado, foi designado para a Estação da KGB em Tóquio em fevereiro de 1975.
Sua identidade secreta era a de correspondente em Tóquio da revista semanal soviética de assuntos internacionais Novoye Vremya.
Na Estação do KGB em Tóquio, ele serviu na divisão de Medidas Ativas (RP) e, antes de desertar, era o chefe interino dessa divisão, supervisionando cinco agentes.
Em 24 de outubro de 1979, ele desertou para os Estados Unidos, deixando sua esposa em Tóquio e um filho na União Soviética.
(Veja também: “Stanislav Levtchenko”)
Exposição
Em 14 de julho de 1982, Levtchenko testemunhou numa audiência fechada presidida por Edward Boland, da Comissão Permanente de Inteligência da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, expondo toda a extensão das operações de medidas ativas da KGB contra o Japão.
O testemunho foi noticiado no Japão em 2 de dezembro daquele ano e, em 9 de dezembro, a comissão divulgou um relatório intitulado “Medidas Ativas Soviéticas”, incluindo documentos relacionados.
Em 10 de dezembro, o próprio Levtchenko deu uma conferência de imprensa em Washington e, em maio de 1983, o jornalista John Barron, especialista em KGB e editor da Reader’s Digest, publicou um livro baseado no testemunho intitulado “KGB Today: The Hidden Hand”.
Embora Levtchenko tenha sido condenado à morte à revelia por um tribunal militar soviético em agosto de 1981 por alta traição, ele mais tarde adquiriu a cidadania americana em 1989.
Testemunho – As atividades de Levtchenko
Enquanto esteve no Japão, Levtchenko foi responsável pelas Medidas Ativas, que envolviam contactar figuras da política, dos negócios e da mídia para manipular a opinião pública e a política no Japão em uma direção pró-soviética.
Em última análise, o seu objetivo era também minar as relações entre o Japão e os EUA.
Classificações dos agentes da KGB
Dentro da KGB, os colaboradores em operações ativas eram categorizados como «agentes», classificados em quatro tipos:
- Agentes reais: indivíduos totalmente sob o controlo da KGB.
- Contatos de confiança: figuras influentes na política, nos negócios, na academia e na mídia que cooperavam conscientemente com a KGB, fornecendo informações ao lado soviético ou disseminando desinformação no país.
- Contatos amigáveis: indivíduos que ainda não eram colaboradores plenos, mas mantinham laços amigáveis com agentes secretos da KGB que se faziam passar por jornalistas ou empresários.
- Contatos em desenvolvimento: indivíduos que a KGB identificou como promissores após várias interações.
Durante o tempo em que Levtchenko esteve em Tóquio, pelo menos 200 cidadãos japoneses foram classificados como agentes da KGB.
Agentes diretos de Levtchenko
Levtchenko lidou diretamente com cerca de 10 agentes japoneses, que eram remunerados pelos seus serviços.
Ele revelou 33 codinomes, incluindo nove nomes reais de agentes.
Entre os indivíduos nomeados estavam:
- Hirohide Ishida (ex-ministro do Trabalho) – codinome: Hoover
- Seiichi Katsumata (ex-presidente do Partido Socialista do Japão) – codinome: Gabber
- Shigeru Itō – codinome: Grace
- Takuzō Ueda (membro da Dieta do JSP) – codinome: Uranov
- Takuji Yamane (editor-chefe adjunto do Sankei Shimbun) – codinome: Kant
(Todos os títulos referem-se a 1979.)
Todos os nove negaram as acusações, alegando que eram infundadas e sem fundamento.
Entre os agentes com codinomes também estavam pessoal da mídia, professores universitários, elites empresariais, funcionários do Ministério das Relações Exteriores e funcionários do Gabinete de Inteligência e Pesquisa.
Ele também citou oito agentes da KGB que entraram em contato com esses agentes, incluindo:
- Ivan Kovalenko, ex-tenente-coronel da KGB e então vice-diretor do Departamento Internacional do Partido Comunista Soviético na Divisão do Japão
- Yerokhin e Glyanov, chefes da estação da KGB em Tóquio (1975-79)
Exemplos de medidas ativas
Levtchenko citou vários exemplos:
- Uma reportagem de janeiro de 1976 no Sankei Shimbun, supostamente citando o testamento do primeiro-ministro Zhou Enlai após sua morte, era na verdade uma invenção da KGB.
- Os agentes do Ministério das Relações Exteriores “Nazar” e “Rengo” teriam vazado vários telegramas diplomáticos confidenciais.
- O agente de segurança pública “Schweik” transmitia informações através do agente de mídia “Ares”.
A advertência de Levtchenko
No seu testemunho, Levtchenko enfatizou:
«A maioria dos japoneses é chocantemente indiferente à realidade e ao objetivo das operações de inteligência e propaganda soviéticas. O trabalho da KGB contra o Japão é persistente e minucioso. Sem uma lei antiespionagem ou uma lei de proteção de segredos nacionais, o governo japonês não pode combater eficazmente as atividades de inteligência estrangeira nem tomar medidas contra colaboradores internos.»
Investigação japonesa
Em março de 1983, o Departamento de Segurança da Agência Nacional de Polícia e a Divisão de Segurança Pública da Polícia Metropolitana de Tóquio enviaram secretamente dois oficiais aos EUA para entrevistar Levtchenko.
Eles também começaram a entrevistar indivíduos nomeados como agentes e lançaram uma investigação para apurar os factos.
Em 23 de maio de 1983, a Agência Nacional de Polícia anunciou a sua conclusão:
Embora Levtchenko tivesse contato direto com 11 indivíduos, incluindo membros da Dieta, devido ao prazo de prescrição e à falta de provas materiais, era impossível prosseguir com a ação penal.
Concluíram que nenhum dos 11 era “agente real” e que, no máximo, eram “contatos de confiança”, sem nenhum caso comprovado de vazamento de informações prejudiciais aos interesses nacionais. A investigação foi encerrada.
No entanto, as autoridades consideraram o testemunho de Levtchenko altamente credível.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros, que era suspeito de ter vazado telegramas confidenciais, conduziu sua própria investigação sobre os supostos agentes “Nazar” e “Rengo” e concluiu, no final de maio, que nenhuma informação confidencial havia sido vazada.
Resposta soviética
Em 1981, o tribunal soviético condenou Levtchenko como traidor e mentiroso.
Ivan Kovalenko, então chefe da Secção Japonesa do Departamento Internacional do Partido Comunista, também denunciou Levtchenko nos seus escritos como um «mentiroso mentalmente instável».
Os agentes da KGB Svetlana e Nikolai Ogorodnikov tentaram localizar Levtchenko nos EUA, mas este esforço foi posteriormente exposto no infame caso de espionagem de Richard Miller.
Nota
Tsuneo Watanabe, presidente do Grupo Yomiuri Shimbun, comentou mais tarde que o então secretário-chefe do Gabinete, Masaharu Gotōda, havia solicitado a demissão de um repórter do Yomiuri envolvido no caso Levtchenko. Watanabe disse que adiou a transferência do repórter para que não parecesse ser uma pressão do governo.
Hoje, tudo o que precisamos fazer é substituir «Levtchenko» por agentes da China ou da Península Coreana.